porque a Europa não gosta de feriados

É melhor saber: a Europa é um mito que muitos europeus discordam e desconfiam, mas que, graças à baixa-estima e ao complexo de vira-lata de outros continentes, é difundido e reafirmado.

Largamente comprada e vendida, há uma aura no imaginário de o que é a Europa. “Lá as coisas funcionam melhor”, “as pessoas são mais civilizadas” , “lá sim tem História” e frases assim eu coletei antes de partir para meu doutorado no exterior. A isso chamo vontade de ser colonizado novamente. Estou me prontificando a esclarecer este equívoco latino-americano com observações de temporária residente portuguesa que sou, pois a visão de turista encerrou ainda em minhas primeiras semanas aqui ─ e isso faz toda a diferença.

Hoje é o Dia de Portugal. Uhu, feriado! Um dos raros que encontrei no calendário no início de janeiro. Eles eram poucos não porque seriam em finais de semana, mas porque quatro deles foram abolidos dois anos atrás. 10 de junho foi um dos poucos sobreviventes ao corte de feriados de 2013, que durará cinco anos. O objetivo é gerar mais renda em quatro dias a mais do ano. Grande luta sindical para serem pagos os dias a mais de trabalho, claro, com poucas conquistas. Portugal, definitivamente, é um mau patrão. Isso é a crise. O Euro está aí para provar isso. É a crise no cotidiano da população. E isso turista não vê.

O dia de hoje foi eleito no Estado Novo (vulgo, ditadura salazarista) para homenagear o nacionalismo. Forjou-se, então, o dia da morte de Camões como referência para a data, justificando o nome: Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas. Tudo bem, toda a sociedade precisa de marcos fundacionais e, ao longo do tempo, governos ditatoriais demonstraram imensa habilidade em criar mitos. A situação crítica está no final do nome: Dia das Comunidades Portuguesas. Até 1974, 10 de junho era o Dia da Raça. A raça superior que difundiu a língua portuguesa pelo mundo a fora. A lusofonia a serviço de uma língua comum, hegemônica, consensual. Qualquer linguista pode acabar com este purismo fantasioso em menos de dois minutos de argumentação.

A Europa não é tão simples como uma visita de poucos dias pode dar a entender. Ela não é plana como gostaria um guia de viagens. O olhar colonialista se inverte e se amplia ao encontrar adeptos que propagam a síndrome do quintal (europeu) ao lado ser mais verde e seguro, rebaixando o que temos em casa. Este amor todo não é recíproco.

Só quem espera meses por um feriado sabe como é.

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